QUEM É A MÃE DE VITÓRIA?
(Artigo escrito em 2012, e somente agora publicado)
Os
números dos institutos de pesquisa são, neste caso, instrumento valioso para
ajudar a perceber o alcance desta pergunta no imenso universo dos
telespectadores da TV brasileira.
Prefiro
começar a reflexão refrescando a memória reportando a uma das fantásticas
histórias bíblicas narradas no Antigo Testamento. Trata-se dos provérbios de
Salamão, para quem foi apresentada uma criança cuja maternidade era disputada
por duas mulheres, ambas apresentando-se como progenitoras.
Depois
de ordenar que a criança fosse partida ao meio e que cada uma recebesse uma
parte do que seria seu filho, Salomão entregou a criança para a que julgou ser
a verdadeira mãe, a qual abdicou do seu direito em nome da vida do recém
nascido.
Esta
clássica história permite-nos colocar a temática da teledramaturgia brasileira
à luz da Campanha da Fraternidade de 2012. Para muito além do que decidir se no
caso da Vitória houve violação do código de ética médica, se a verdadeira
maternidade deve ser atribuída a Ester, que, em outros tempos se chamou de
barriga de aluguel, ou se a maternidade tem estreitas e confiáveis comprovações
biológicas por conta da doação feita pela Bia afim de que o sobrinho da Dora.
pudesse ter um irmão.
A
imprensa fecundou o imaginário popular sobre a questão da
maternidade/paternidade apimentando com a já polêmica permissão da adoção por
casais homoafetivos ou o direito de registrar os filhos com o nome de duas mães
e dois pais.
Todas
estas questões tem sim sua importância e todos os envolvidos merecem respeito,
admiração e decisão legal sobre a progenitura dos que foram gerados.
Todavia,
à luz do Tema da Campanha da Fraternidade 2012 – Saúde e Fraternidade e com o
lema: “Que a saúde se difunda sobre a terra”, prefiro fazer um questionamento ético
que, a meu ver, é muito anterior à
geração ou reconhecimento de paternidade.
Embora
os noticiários tenham silenciado sobre o assunto, ainda está bem presente na
memória nacional o caso dos pais paranaenses que depois de uma fecundação
artificial geraram três filhos e insistiram na possibilidade de reconhecer
apenas 2 deles.
Neste
sentido desejo propor uma reflexão a partir do direito constitucional
brasileiro de que a saúde é um direito de todos.
a)
Considerando
que o SUS é um programa abrangente de saúde pública ao alcance de todos;
b)
A
ciência e a medicina estão a serviço da vida e da qualidade de vida;
c)
Os
profissionais da saúde, e os pesquisadores brasileiros merecem ser qualificados
entre os melhores do mundo.
d)
Considerando
que o número de casais impossibilitados de gerar filhos é bastante
significativo na sociedade brasileira;
e)
Considerando
que os procedimentos clínicos para que se dê uma gestação assistida servindo-se
dos recursos da ciência e da medicina são procedimentos de alto custo.
A
pergunta mais sábia, prudente e ética não será questionar-se sobre o verdadeiro
alcance da Saúde Pública no Brasil? Dito em outras palavras a serviço de quem
estão os avanços da medicina? ou quem
tem poder aquisitivo para beneficiar-se das novas tecnologias e da qualidade de
vida que deveria estar ao alcance de todos?
Não
parece ser muito mais cristão, e porque não dizer Salomônico, em lugar de
legislar sobre a divisão dos filhos gerados. Em lugar de cortá-los pelo meio, literalmente em filhos
biológicos e filhos do coração (e tantas outras nomenclaturas que tem aparecido
em tempos recentes) utilizar todos os recursos para que os benefícios da
ciência estejam ao alcance de muitos em detrimento daqueles cujo poder
aquisitivo permite tais disputas?
Não
parece ser mais cristão, e porque não dizer Salomônico, em lugar de dispender
recursos para julgar casos de paternidade/maternidade biológica, facilitar e
estimular a adoção de crianças em situação de risco e vulnerabilidade social?
Sinceramente
desejaria que a penitência, a oração, o jejum, a esmola e a conversão desta
quaresma estivessem inebriados do clamor erguido pela Campanha da Fraternidade
2012: “Que a saúde se difunda sobre a terra”.