DA ESCOLA QUE TEMOS PARA A ESCOLA QUE
QUEREMOS
As considerações que o
professor Juarez Thiessen procurou condensar no final da fala da Prof.ª
Jaqueline Moll, por ocasião da 4ª Web Conferência no processo de atualização da
proposta curricular de Santa Catarina, foram, por assim dizer, uma
contemporização daquilo que se tem e onde se poderá chegar com o sonho de uma
escola possível.
Entretanto toda a fala da
conferencista foi provocativa, ao mesmo tempo não apontou alternativas que
signifiquem viabilidade em curto prazo. Não
sem argumentos ela insistia sempre em médio prazo, em responsabilidade de mais
de um governo e assim por diante.
Com todo o respeito pelas
considerações, cujos pontos que me pareceram importantes vou comentar a seguir
a fala que parece colocar a escola, os educadores e os responsáveis pela
educação às voltas com uma pergunta clássica: “O ovo ou a galinha”? Trata-se de uma Utopia possível, mas seria
muito interessante pelo menos algum indicativo de por onde começar.
Para efeito didático vou
organizar meu comentário em tópicos.
1)
Considerações Iniciais
A professora tem uma posição clara e coerente afirmando que está
acabando o tempo em que a educação é pensada por alguns e executada por outros.
Sem conhecer a realidade catarinense fez alguns acenos que foram pertinentes.
Diversos outros pontos poderiam ser ainda elencados destacando o caráter
democrático e participativo que se está estabelecendo em Santa Catarina. Permitam-me, sem ser ufanista, dizer que o
processo de Atualização da Proposta Curricular, que conta com a participação
de, pelo menos, parte da comunidade
escolar foi iniciativa importante e de destaque. Entendo isso como um bom uso
das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação.
Outro ponto importante acenado pela Professora diz respeito aos comparativos
que fartamente se faz em relação à condição da nossa educação com os países
desenvolvidos. As observações são oportunas e pertinentes. O Brasil tem maior
número de matrículas que a população inteira de alguns países centenários na
organização dos seus sistemas educacionais. Some-se a isso o fato de só
recentemente o País estar tateando um sistema de ensino com reais
possibilidades de acesso para todos.
Concordo em gênero, número e grau que se trata de um sonho impossível a
universalização do ensino superior e que se trata de um equívoco focar o ensino
médio na preparação dos nossos jovens
para o ENEM ou para o Vestibular e pior que isso ainda está focado na nota,
como elemento indispensável no processo dando pouca ênfase para a aprendizagem
que faz a diferença.
A oferta de cursos técnicos é com certeza uma alternativa para a
parcela da população que não tem interesse na continuidade dos estudos, porém,
estamos de fato correndo o risco de transformar essa etapa, num adestramento
para o trabalho.
Embora a Prof.ª Jaqueline não tenha acenado, entendo que ela se referia
a necessidade de que os cursos técnicos fossem todos de nível pós-médio e eu
diria, que tal acontecer também um pós-médio, como uma espécie de
pré-requisito, para alunos que depois
vão entrar nos cursos superiores. Algo como são as escolas europeias, e aí sim
viria o momento do aprendizado de uma segunda língua e outras especificidades
para entrar no campo da pesquisa que seria próprio do curso superior.
2)
Apontando Caminhos
O ensino médio precisa garantir a apropriação de saberes que façam
diferença na vida dos jovens e isso
implica em compreender o meio termo entre cultura da reprovação que se
constitui na pura e simples repetência. Alias “repetente” era o termo utilizado
pela legislação 4024 dos anos 1960. Infelizmente quanto se fala em não reprovar
a primeira imagem que salta aos olhos é “aprovação automática”. No cotidiano do
processo de aprendizagem ainda se vai facilmente “do mar ao pantanal”
Pior que a cultura da repetência é a falta de compreensão de que está
entrando em nossas escolas uma “nova classe
C”, que na fala da professora se identifica aos filhos das famílias
beneficiadas pelos programas sociais do governo. Sem contestar os números acho
que esta nova classe é resultado maior ainda do que isso e que, infelizmente, a
escola está recebendo, porém os mantém na condição de alunos problemas,
bulinados, e incluídos, desde que se
mantenham à parte.
É recente a possibilidade dos filhos dos pobres ter mais escolaridade
que seus pais, mas a nossa escola ainda está longe de garantir que este aluno
“diferente” chegue e permaneça. O processo de democratização vai, lentamente,
fazendo acontecer a democracia sob o
ponto de vista de dar a todos o mesmo ponto de partida. Trabalhar o conflito que o aluno vive fora da escola no
espaço escolar é um desafio, para este momento,
longe de ser possível.
3)
Recuperação histórica
Citar os educadores, Anísio Teixeira, John Dewei, Jacques Delors, Paulo
Freire, Jean Freinet, Leonardo Boff, mostrou o conhecimento e a clareza da
opção pedagógica da professora Jaqueline.
A aplicação, na atualidade, de alguns sonhos que se levantaram na
primeira metade do século XX e no final do segundo milênio aponta para um
amadurecimento da educação neste País.
4)
A escola que queremos
A insistência na escola em
tempo integral, com a clara distinção entre formação integral, educação
integral e educação em tempo integral, vem de encontro com um dos desafios mais
urgentes para o Brasil que queremos. Permanecer na escola e que ela seja
“atrativa”, por mais tempo é uma condição “sine
qua” não haverá um aprendizado de qualidade. Este é o “calcanhar de
Aquiles” que os países ocupantes de posição de topo na educação já resolveram
há muito tempo. Entendo que o Plano Nacional de Educação fará acontecer isso,
independente de qual teoria de governo seja o executor.
Nossas escolas estão longe de
compreender o que são parcerias e a professora citou como exemplo a biblioteca.
Pensemos que cada uma de nossas escolas tem relativo acervo bibliográfico,
raramente uma delas tem bibliotecário, quando muito um professor que atende a
biblioteca. No projeto do Ensino Médio Inovador está previsto o professor
orientador de leitura, e que em muitos casos trata-se de um professor que
recebeu pouca ou nenhuma preparação para esta função indispensável na escola.
As aulas de leitura, como de resto todas as demais, que continuam sendo em
salas de aula continuam sendo de 45 minutos e o professor é “mascate de
conteúdos”, que de sala em sala vai dando conta de cumprir o conteúdo mínimo
que o livro didático sugere para aquela etapa.
Nossas escolas são feias, mal
cuidadas, do alicerce ao acabamento, não convidam à apreciação. Mesmo escolas
recentemente construídas deixam a desejar neste quesito. As mais antigas então
se comparam aos “cortiços” dado o número de “puxadinhos” que foram sendo
construídos ao longo do tempo.
Como pensar num professor que
conheça seus alunos enquanto peregrina em 15 turmas, não raro em três escolas
diferentes, que quando não estão em espaço geográfico diferente é uma escola no matutino, outra no vespertino
e uma terceira noturna.
Os afastamentos até que são
poucos se considerar a loucura de ser professor neste contexto. Como garantir
que o professor possa colaborar com o aluno para uma compreensão de mundo onde
ele seja sujeito com professores e uma escola que precisa ser ainda professor-Centrica.
Que a escola é um lugar da
reclusão é um fato inegável, o uso de recursos tecnológicos, mesas coletivas,
trabalho produzido socialmente tudo isso só é possível numa escola que
desenvolva projetos com professores preparados para esta nova maneira de fazer
educação. Como se pode esperar leitura de um professor que precisa preparar
aulas para 15 turmas, de duas disciplinas distintas, em três escolas diferentes
e que ainda precisa corrigir as provas de todos os alunos. Concluindo a
professora foi muito feliz na afirmação que formação integral só se faz com
maior permanência na escola, a qual ela qualificou como escola de turno único.
5 - Relatório Delors
Os quatro pilares da educação
apontados neste relatório, acrescido do quinto, que se trata do saber cuidar
sob a ótica da espiritualidade são
indispensáveis para a educação que se quer.
1-
Aprender a conhecer (estamos até indo bem);
2-
Aprender a ser ( quem é cada um desses alunos
que chega à escola);
3-
Aprender a conviver (que pensam que conflito se
resolve no tapa ou no grito); Têm implicações filosóficas com quem eu tenho que
dialogar.
4-
Aprender a fazer (Jhon Dewei – a pedagogia pelo
trabalho e não somente para o trabalho). De uma pedagogia que irá converter a
escola em comunidade em que as tarefas são compartilhadas. Alguém virá limpar o
lixo. Isso implica em organizar as tarefas a divisão delas no cotidiano da
escola.
Jean
Freinet – A escola é um espaço aonde se vai construindo a perspectiva de país.
5 – Aprender a cuidar - (Leonardo
Boff – Visão de espiritualidade que transcende as religiões)
6 - Grandes elementos para a formação integral e para o tempo integral
A)
Currículo – marca toda a vivência escolar;
superar a oposição de turno versos contra turnos;
B)
Carreira docente – professores de tempo
integral;
C)
Formação para a escola de tempo integral – não
há ainda isso nas licenciaturas – é preciso pensar em projeto de escola;
D)
Infraestrutura – não temos uma escola preparada
para o dia inteiro. (número 80 do “Em aberto” do INEP).
E)
Gestão – administrar uma escola de tempo
integral é menos complicado do que uma escola de turnos.
7- Considerações finais
A questão da distribuição desigual do conhecimento e de
acesso a ele, os mecanismos de recuperação que ainda estão longe de ser
processuais, dar ouvidos aos nossos alunos, eliminar o preconceito geracional,
ser capaz de dialogar com a revolução tecnológica em curso, diminuir a escola
professor-centrica, entender o uniforme como identificação e não como
uniformização, inscrever-se para pedir a palavra, mesas coletivas, e professor
que vai ao aluno, garantir que os conteúdos sejam trabalhados desde a ótica
prevista pela base nacional comum, são condições de “estranhamento” ainda longe
da realidade, que, no entanto é preciso perseguir de modo obcecado.
Para concluir faço minhas as palavras do escritor gaúcho
Érico Veríssimo, citado pela professora Jaqueline Moll, na 4ª Web Conferência
durante o processo de atualização da proposta curricular de Santa Catarina:
“Desde que adulto, comecei a escrever romances, tem me
animado até hoje a ideia de que o menos que um escritor pode fazer, numa época
de atrocidades e injustiças como a nossa, é acender a sua lâmpada, fazer luz à
realidade do seu mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão, propícia aos
ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a sua lâmpada a despeito da
náusea e do horror.
Se não tivermos uma lâmpada acesa, acendamos ao menos um
toco de vela, ou em último caso, risquemos fósforos repetidamente como sinal de
que não desertamos do nosso posto”.
A metáfora de “acender fósforos sem desertar do posto” é o
desafio de fazer uma escola diferente para um tempo diferente e uma sociedade
diferente.
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